sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Traduzindo letras em imagens



"Porque o roteiro é o sonho de um filme" 

Jean-Claude Carrière


Quem leu o romance autobiográfico de José Mauro de Vasconcelos, escrito em 1967 e publicado um ano depois, com certeza emocionou-se com a história de Zezé. Difícil conter as lágrimas em determinados momentos da história de sua infância. 
Não que Zé Mauro, o Zezé do livro, fosse um santo, vítima e mártir de um destino absolutamente cruel. Ao contrário! Zezé é um garoto levado, traquinas, respondão, teimoso e também criativo, sonhador, sensível e carente. Zezé é o prenúncio do escritor famoso, do homem que escreveria mais de 20 livros e seria traduzido em quase todas as línguas do planeta. 
Zé Mauro, superada a sua própria e marcante fase de transição da infância, iria tornar-se um grande aventureiro, um viajante, um sagaz observador apaixonado pela gente simples da nossa terra. Contou sua história em 4 romances, sendo o primeiro, sobre sua infância em Bangu-RJ, o mundialmente aclamado "O Meu Pé de Laranja Lima". A este, em épocas distintas, seguiram-se "Vamos Aquecer o Sol", "O Doidão" e, finalmente, "Confissões de Frei Abóbora", sobre seus anos de maturidade.
Marcos Bernstein já era um consagrado roteirista quando decidiu, junto a Melanie Dimantas, a recontar, desta vez visualmente, os marcantes anos de vida do menino Zezé, a criança inventiva e catalizadora dos dramas que a cercam. Começava então o "sonhar o filme", nas palavras de Jean-Claude Carrièrre.
Seu currículo, como roteirista abrange "Central do Brasil", Terra Estrangeira", "O Xangô de Baker Street", "Oriundi" (dirigido por Ricardo Bravo, que atua como Dr. Adauto Faulhaber nesta versão do "Meu Pé de Laranja Lima"), "Pierre Verger - Mensageiro entre dois mundos", "Visão do Paraíso - Paixão de Tom Jobim pela mata", "Inesquecível", "Zuzu Angel" e "Chico Xavier". Com sua parceira no roteiro do "Meu Pé de Laranja Lima", Melanie Dimantas, também escreveu (e estreou na direção) "Do Outro Lado da Rua", que também é uma produção da Passaro Films.
Melanie Dimantas, co-autora do roteiro que traduz o best-seller de José Mauro de Vasconcelos para o cinema, é também autora de outros tais como "Carlota Joaquina", Olhos Azuis", "O Outro Lado da Rua", "Copacabana", "Duas vezes com Helena", "Não quero falar sobre isto agor", "Avassaladoras", "Gatão de meia-idade", "Mulheres do Brasil", Irma Vap - o retorno", "Porralokinhas".
Os filmes que gostamos, aqueles que ficam em nossa memória, são os cujas personagens nos cativam, impressionam, nos fazem amá-las ou, até mesmo, odiá-las. Grande heróis ou heroínas inspiram e nos fazem apaixonar por eles; grandes vilões nos provocam e fazem com que queiramos entrar na tela para desafiá-los!
Outro elemento importante é a "missão" do herói, isto é, o fio condutor da história, o "destino" que provoca os acontecimentos que irão gerar conflitos, desafios e obstáculos que o personagem principal terá de enfrentar para conseguir o seu intento, seja ele material (casar com a mocinha, descobrir o tesouro, etc) ou imaterial (conseguir a liberdade, crescer, etc). Para tanto é necessário um "empurrão", algo que subitamente aconteça na vida do personagem e que o jogue dentro da aventura que estamos a assistir. E, é claro, precisamos de um clímax, um momento máximo de tensão na história, uma situação que irá definir os destinos de todos os envolvidos na história e que depende exclusivamente do herói.
E, muito importante, isso tudo contado em aproximadamente 90 minutos!
Enquanto um livro é pensado de forma literária, escolhendo palavras e descrevendo extensamente ações, personalidades, situações, pensamentos, um roteiro é escrito pensando em imagens, diálogos e sons.
Assim também Marcos Bernstein e Melanie Dimantas, a quatro mãos, reescreveram, pensando em atuações, tipos físicos, movimentos de câmera, luzes e sombras, texturas e sons, música e silêncios a história do esperto moleque Zezé que, da noite para o dia, tem que enfrentar uma vida de privações, compreender os sentimentos vividos pelos adultos, buscar refúgio na fantasia e descobrir que a realidade nem sempre é tal qual a imaginamos.
Roteiro impecável, "Meu Pé de Laranja Lima" atualiza para a grande tela o universo vivido e narrado por Zé Mauro de Vasconcelos, esse sensível escritor que, até morrer aos 93 anos de idade, foi também artista plástico e ator de cinema e TV. Homem culto, experiente, versátil e emotivo que era, com certeza iria apaixonar-se, como todos nós, pelo tratamento dado à sua história.


Imagem: Foto por Juliano Braz

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